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Injeção e ignição: Diagnóstico em veículos colecionáveis modernos

Modelos com 20 anos de idade ou mais são oportunidade de negócio; conheça a análise de injeção e ignição em um veículo Honda Civic Coupé 1.6 1997

por Fernando Lalli
fotos Rafael Guimarães

Mecânicos mais experientes se lembram de como a mudança de tecnologias na segunda metade da década de 1990 impactou o setor de manutenção automobilística no Brasil. A virada definitiva do carburador para a injeção eletrônica entre os veículos leves e, logo após, a chegada dos motores eletrônicos nos pesados, levou oficinas e profissionais a se reinventarem completamente.

 

Muitos não conseguiram concluir essa transição: números de diversos órgãos como o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) apontam que de 2000 a 2007 o total de oficinas mecânicas em operação caiu de 147 mil para 84 mil em território nacional. Somente de 2008 em diante se observou reação, com crescimento tímido e gradual, estabilizando-se em um patamar próximo a 120 mil oficinas mecânicas hoje no Brasil.

 

 

Um novo impacto no setor é esperado com a popularização de veículos híbridos e elétricos, cuja tecnologia revoluciona o conceito de manutenção de automóveis. É impossível prever com exatidão o que vai acontecer com o mecânico independente, mas a tendência é que o setor seja ressignificado por completo a longo prazo. Muitas oficinas terão que focar em negócios diversificados para sobreviver.

 

Entre as alternativas, um mercado que cresce cada vez mais é o de veículos de coleção – não só os mais antigos como também modelos que fazem parte da história recente da indústria. Nesse segmento, o público consumidor é especializado, apaixonado pelos carros que mantém, e dedica parte do seu orçamento pessoal ao investimento constante não só ao detalhamento e/ou customização do veículo como também às manutenções preventiva e corretiva.

 

Considerando que automóveis com potencial colecionável necessitam de manutenção como qualquer outro, e que têm cada vez menos (ou nenhum) apoio das concessionárias, esta pode ser uma oportunidade para as oficinas independentes tradicionais se manterem rentáveis e relevantes mesmo quando a eletrificação estiver mais próxima da realidade das ruas.

 

 

Por outro lado, oficinas generalistas tendem a receber veículos cada vez mais antigos e demandas de diagnóstico e serviços mais profundos. Isso porque a frota nacional está envelhecendo e a renovação diminuindo progressivamente. Dados do Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores) apontam que a idade média entre os automóveis leves subiu de 8 anos e 11 meses em 2015 para 9 anos e 10 meses em 2019. Do total de 37,1 milhões de automóveis de passeio que rodam hoje pelo país, 27% apresenta idade média de até 5 anos (2014 em diante), 54% entre 6 e 15 anos (2004 a 2013) e 18% tem 16 anos de idade ou mais (2003 para trás). Portanto, é mais do que necessário se acostumar a reparar sistemas que, há 20 anos, eram novidade.

 

 

DE OLHO NAS TENDÊNCIAS

Para um carro adquirir status de colecionável, basta pertencer a um nicho de interesse. Vide a linha “quadrada” da Volkswagen (Passat, Gol, Voyage, Parati, Santana e Quantum dos anos 80 e 90), cujos exemplares, dependendo do estado de conservação, podem ultrapassar em valor de revenda até alguns veículos novos de entrada. Já versões mais raras dos Chevrolet Opala e Ford Maverick têm inflação absurda, e chegam a custar mais do que os SUVs e sedãs médios zero-km.

 

 

Um dos nichos de interesse são os modelos japoneses da década de 1990. O proprietário do Honda Civic Coupé 1.6 1997 importado desta matéria é um exemplo desse consumidor: procurou o carro por meses em sites de venda de automóveis e, para comprá-lo, se desfez de outro Civic da mesma geração, só que mais novo e na variante sedã, fabricado no Brasil em 2000.

 

Apesar de uma mecânica bastante próxima ao que se vê mesmo hoje em dia, alguns detalhes podem causar dúvidas na hora do reparo. Por isso, levamos o carro para o Centro de Treinamento Automotivo da Bosch na cidade de Campinas/SP para a análise das características e diagnóstico dos sistemas de injeção e ignição. O procedimento foi feito pelo instrutor técnico Leonardo Zacharias Pereira Filho.

 

 

FLUXO DE ADMISSÃO, INJEÇÃO E IGNIÇÃO

1) O Honda Civic Coupé 1997 EX possui motor 1.6 16 válvulas (código D16Y8) (1a). Seu corpo de borboleta é antecedido por um sensor de temperatura do ar (1b).

2) Este corpo de borboleta, por ser de tecnologia menos atual, possui um atuador para regulagem de marcha lenta (2a) e um sensor de posição da borboleta (TPS) (2b).

3) O coletor de admissão possui um sensor de pressão (MAP).

4) A eletroválvula do sistema VTEC de variação de fase nas válvulas de admissão pode ser vista ao lado do cabeçote. “O sistema VTEC (Variable Valve Timing and Lift Electronic Control) altera os parâmetros de curso e tempo de abertura das válvulas para dosar a quantidade de ar admitido dentro do cilindro para uma fração mássica e volumétrica final ideal”, explica Leonardo Pereira.

5) Na injeção, o regulador de pressão de combustível funciona sob princípio pneumático a vácuo proveniente do coletor de admissão e pressão atmosférica quando o conjunto de borboleta está totalmente aberto.

6) A maior particularidade do motor está na ignição, que possui um conjunto distribuidor que reúne a bobina, sensor de velocidade, sensor de PMS e sensor de fase.

7) Para executar a leitura do oxigênio nos gases de escape, a sonda lambda é de quatro fios, com aquecedor integrado.

8) Outro detalhe interessante é o módulo separado que reúne os relés e fusíveis da bomba de combustível, conjunto bomba do sistema ABS e do motor.

9) Tanto o módulo do motor quanto o módulo do ABS estão localizados dentro do habitáculo ao lado do passageiro.

COMUNICAÇÃO COM O SCANNER DE DIAGNÓSTICO

10) Por se tratar de um veículo fabricado nos anos 90, antes da padronização das portas de comunicação com equipamentos de diagnóstico, não há conector OBD. “Em 1997, não tinha ainda a padronização dos conectores de leitura. Até então, havia aquela maleta com um monte de cabos e adaptadores para conseguir realizar o diagnóstico”, relembra o instrutor técnico da Bosch. O Civic desta matéria possui duas tomadas azuis: uma com dois pinos e outra com 3 pinos abaixo do volante.

11) A tomada de 3 pinos se destina justamente ao diagnóstico via scanner. Para plugar um aparelho de diagnóstico KTS da Bosch ao Civic 1997, é necessário utilizar um cabo adaptador universal. No conector, pela ordem da esquerda para a direita, o pino 1 corresponde à linha “K” de comunicação com a unidade de comando, o pino 2 é a alimentação positiva 12 V e o pino 3 corresponde ao negativo (11a). Pelo equipamento, Leonardo acessou a memória de erros e identificou um código de sonda lambda defeituosa (11b). Foi possível também apagar esse código da memória após a correção do problema.

12) Já a tomada de 2 pinos serve para realizar o diagnóstico via código lampejante de falha pela luz no painel. Para acessar esse modo, é necessário fazer um ” jumper” entre os dois pinos (12a). Nesse momento, começa a piscar a luz de injeção em intervalos que correspondem ao número do código de falha, se houver (12b). Intervalos maiores correspondem às dezenas e intervalos menores, às unidades.

MÓDULO DE IGNIÇÃO

13) A primeira coisa que chama a atenção no conjunto de distribuição da ignição (13a) é a quantidade de fios em seu conector (13b). O sistema possui nove fios. Isso porque o conjunto contém o sensor de posição de ponto morto superior, sensor de identificação de cilindro e sensor de rotação. São dois fios para alimentação da bobina (linha 15, negativo), um fio para o conta-giros, dois fios para o sensor de velocidade, dois fios para posição do ponto morto superior e dois fios para a fase do motor que identifica do cilindro, como pode ser visto no esquema elétrico (13c).

A1 – Distribuidor de ignição
T1 – Bobina de ignição
B3 – Sensor de velocidade de rotação
B4 – Sensor de PMS
B5 – Sensor de identificação cilindro
E1 – Velas de ignicao
X1A – Conector da unidade de comando A gerenciamento do motor
P1 – Conta-giro

INJEÇÃO E IGNIÇÃO AJUSTE DO ÂNGULO DE IGNIÇÃO

14) É possível movimentar mecanicamente o conjunto de distribuição para acertar o ponto de ignição. O conjunto é fixado por 3 parafusos em furos oblongos. Para fazer o acerto o procedimento deve seguir uma rotina determinada.

15) A unidade de gerenciamento eletrônico do motor precisa ser “avisada” de que será feita uma intervenção mecânica no ponto de ignição do motor. Por isso, comece o procedimento fazendo o “jumper” no conector de diagnóstico de dois pinos, como executado antes para obter o código lampejante no painel.

16) Remova a vela do cilindro número 1 e gire o motor para verificar se o ponto morto superior (PMS) do pistão corresponde corretamente à marcação na polia do virabrequim. Esta marcação, por sua vez, deve coincidir com um ressalto em “V” na capa do sincronismo. Se por algum motivo a polia não tiver marcação de PMS, o mecânico deve fazer sua própria marcação.

17) Ligue o motor e deixe-o esquentar pelo tempo necessário até que seu eletroventilador dispare por duas vezes. Instale uma pistola estroboscópica para verificar se a marcação da polia com o ressalto em “V” coincidem. Posicione a pinça trigger da pistola (17a) no cabo de vela do cilindro número 1 e acione a pistola para observar se o motor está no ponto (17b). Caso esteja fora do ponto, solte os três parafusos do conjunto distribuidor e movimente-o de forma a alterar o avanço da ignição até que a marcação da polia esteja no lugar certo. “O motor quando está no ponto tem seu funcionamento otimizado e tem sua emissão de poluentes controlada”, conclui Leonardo Pereira. Finalize fixando os parafusos, desligando e removendo o “jumper” no conector.

E O ETANOL NA GASOLINA?

De acordo com a Bosch, veículos importados com sistemas de injeção e ignição eletrônicos, uma vez preparados para suportar o mínimo de 22% de etanol obrigatórios por lei na gasolina brasileira desde outubro de 1993, podem rodar sem problemas com a gasolina comum atual, que possui 27,5% de teor de etanol, “desde que o combustível seja de ótima qualidade”, ressalta Leonardo Pereira. Já veículos a gasolina carburados, que em sua maioria foram projetados para usar gasolina com chumbo, devem ser abastecidos hoje com gasolina premium, que tem teor ligeiramente menor de etanol, na casa dos 25%. “O chumbo atuava como uma espécie de lubrificante. Sem ele, pode haver problemas nas sedes de válvula do motor”, analisa o especialista em Sistemas Automotivos da Bosch do Brasil, Diego Riquero.

Mais informações:

Bosch – boschtreinamentoautomotivo.com.br

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