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A polêmica da conversão

Quem não pode comprar um carro 0 Km com motor flex, conta com uma opção mais barata: a conversão do sistema de injeção, um procedimento que está causando divergências de opiniões no setor.

Carolina Vilanova

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A conversão de motores, originalmente movidos a gasolina, para bicombustíveis, está dando o que falar entre os profissionais da indústria automotiva. Com a invasão dos veículos flexfuel, que agregam a economia do álcool e a redução do índice de emissões de poluentes, empresas especializadas em eletrônica de veículos buscaram uma solução para oferecer a transformação no mercado de reposição: um sistema de conversão para carros usados.
Hoje é possível encontrar diversas oficinas que dispõem desse serviço. Pelo valor de aproximadamente R$ 500,00, um software é instalado no compartimento do motor e, com o auxílio de um interruptor, o proprietário pode escolher que combustível vai utilizar.

Essa tecnologia é aplicada por meio de um aparelho amplificador de sinal, que possibilita a utilização de álcool em carros projetados para rodar com gasolina, que incorporam o sistema de injeção eletrônica.
“Nosso equipamento tem a função de amplificar o sinal original que é emitido pela unidade de comando de veículos a gasolina, ajustando-o às condições ideais para o funcionamento com álcool. Quando o carro está com gasolina, o sinal continua sendo emitido na proporção original”, explica Marcelo Henrique Algarve, do departamento de Marketing da JF Automotive, que produz o JFlex.

De acordo com os fabricantes, a instalação do software é feita por meio de conectores, sem a necessidade de cortar fios ou efetuar qualquer alteração mecânica, e ainda possibilita que seja removido do automóvel. “Devido a grande quantidade de álcool existente na gasolina utilizada no Brasil, que varia de 20 a 25%, a estrutura dos carros a álcool e a gasolina são basicamente as mesmas, o que facilita a conversão”, completa Algarve.

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Outro destaque entre os fabricantes do aparelho é em relação às características do álcool. “Esse combustível traz uma série de benefícios para o motor do veículo, como o aumento da vida útil e a limpeza das peças que acumulam impurezas da gasolina, além de apresentar um ganho de potência ou torque de 3% a 4%”, comenta Algarve.

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A instalação do módulo é realizada na própria oficina sem a necessidade de utilizar equipamentos especiais. A empresa, no entanto, possui departamento de orientação técnica, caso o instalador precise de apoio. “O tempo de instalação de um sistema de conversão dura entre uma e duas horas. Em termos de ferramentas, o mecânico precisa apenas de uma furadeira simples e uma chave de fenda. Os cuidados para não danificar outros componentes é o mesmo para qualquer produto, isto é, exige atenção e cautela”, conta Vitor Hugo Ramos, da Superchips.

Os produtos têm garantia de fábrica que varia de marca para marca, de 90 dias a um ano, e suas características permitem a homologação e legalização da documentação do veículo convertido junto aos órgãos competentes.
Mauro Alkimin, proprietário da DJMA, outro equipamento de conversão, afirma que não precisa mudar nada no veículo. “O DJMA Flex não é um chip, mas um módulo eletrônico gerenciado por um micro controlador, que aproveita os sinais emitidos da unidade de comando do carro para controlar a quantidade de álcool ideal para o motor”, explica.

As oficinas instaladoras do DJMA Flex passam por treinamentos e recebem suporte técnico em caso de dúvidas no momento da instalação, apesar do produto contar com manual de instalação e o certificado de garantia de um ano.

Há controvérsias

O procedimento da conversão de sistema de injeção eletrônica, no entanto, não convence empresas como Bosch, Delphi e Magneti Marelli, responsáveis por desenvolver os sistemas bicombustíveis, e até tricombustíveis, instalados originalmente pelas montadoras nos veículos flexfuel.

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A Bosch afirmou que não reconhece que esses sistemas atendam a todos os requisitos técnicos para que o veículo funcione adequadamente. “As alterações não são feitas sobre todos os componentes necessários e não há testes suficientes para que se garanta que o motor não seja danificado, os veículos para usarem álcool devem sair de fábrica desta maneira”, analisa Fabio Ferreira, gerente de Desenvolvimento de Produto da Bosch.

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De acordo com as marcas, danos em componentes como vela de ignição, bomba de combustível, injetores, escapamento, corpo de borboleta e mesmo partes do motor são inevitáveis. Além disso, o veículo emitirá mais gases na atmosfera e consumirá mais combustível. O motor tem a tendência também de falhar quando estiver frio.

Outro alerta está na documentação do veículo, que deve ser homologada para a utilização de álcool, junto ao Detran. Os fabricantes do conversor afirmam que essa informação é passada para o cliente antes de efetuar o trabalho.

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A opinião da Magneti Marelli também vai contra a conversão de veículos originalmente projetados para utilizar gasolina. “Do ponto de vista legal, o veículo não poderia ser abastecido com álcool e do ponto de vista técnico, vários problemas podem ocorrer inclusive dano permanente da sede de válvulas”, explica Fernando Damasceno, gerente de Desenvolvimento de Novos Produtos da Magneti Marelli.

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“Apesar de ser reversível, os danos causados pela instalação do sistema deixa seqüelas, com destaque para a corrosão, perda de potência devido a vazamento das válvulas de admissão, queima da bomba de combustível, entre outras”, completa Damasceno.

Para a Delphi, essa alteração modifica somente alguns dos parâmetros que fazem parte do sistema completo de gerenciamento do motor, o que pode vir a comprometer a condução e performance do veículo. “Outro fator é a configuração do motor base, que pode não estar adaptada com a taxa de compressão adequada para acomodar o uso do álcool, e também a falta de proteção específica em componentes de extrema importância do sistema, como o caso das bombas de combustível, que nem sempre fazem parte do kit de conversão”, comenta Edson Brasil, diretor da Delphi Soluções em Produtos e Serviços na América do Sul.

“Antes de realizar a conversão, o consumidor deve entender os custos envolvidos para se fazer a correta conversão, com a provável inclusão de mais ítens do que  somente um circuito elétrico auxiliar, e entender que as peças que deveriam ser trocadas, e eventualmente não são; terão sua vida útil comprometida”, completa Brasil.

A opinião das associações

Entre as associações, o dilema da conversão continua. A AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva) e o Sindirepa-SP (Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios do Estado de São Paulo) compartilham a opinião de que a conversão de veículos originais para multicombustível, além de ser ilegal, prejudica os consumidores e o meio ambiente.

Geraldo Rangel, diretor Administrativo e Financeiro da AEA, explica que o motor e a injeção eletrônica são desenvolvidos em conjunto, com auxílio de “mapa”, que indica como a injeção deve atuar em função das diversas variáveis do motor. “Esse “mapa” eletrônico identifica para qual combustível o motor foi desenvolvido ou, nos casos flexíveis, quais combustíveis e misturas que o sistema pode gerenciar e garantir um desempenho adequado”, comenta.

“Com a substituição do chip eletrônico, o novo “mapa” não é compatível com o restante do motor, o desempenho do veículo pode sofrer alterações e consumir mais combustível, além de carbonizar intensamente e até mesmo “bater-pino” – denominação popular para o fenômeno tecnicamente denominado pré-combustão ou detonação”, finaliza.

Sobre o assunto, o Sindirepa-SP declara que apoia as determinações originais das fábricas, que por sua vez, atende a legislação vigente. “A conversão do carro a gasolina para flex, mediante a simples troca de um chip na central eletrônica de injeção e por valores inferiores a R$500,00, além de provocar danos em componentes do motor e oxidação (devido a água presente no álcool hidratado) aumenta o consumo de combustível e a poluição”, diz Antônio Gaspar de Oliveira, diretor Técnico do Sindirepa-SP.

Mais um ponto para enfocar é a perda da garantia, pois há alterações nas características originais do veículo. “Em caso de colisão, o seguro pode não pagar os danos se o carro estiver rodando com álcool e no documento constar o combustível gasolina”, completa Gaspar.

Em relação às oficinas que realizam o serviço, o Sindirepa diz que é de responsabilidade de cada estabelecimento. “É um desrespeito às questões ambientais e aos consumidores”, finaliza Gaspar.
A ASE (Associação Nacional de Excelência em Serviços Automotivos) não condena a transformação. “O mecânico deve advertir seu cliente sobre prováveis danos e a regulamentação dos documentos, além de conhecer bem a procedência do produto, tomar conhecimento da tecnologia aplicada e procurar material de apoio em associações como o Senai”, afirma Geraldo Santo Mauro, presidente da Associação.

Questionados sobre a conversão, o Senai-SP declarou que não possui um estudo conclusivo de viabilidade técnica e econômica sobre as instalações de conversores bicombustíveis, pois sua atuação está focada nas parcerias com montadoras e fabricantes do setor automotivo.

“Os componentes aplicados nos veículos, tais como bomba de combustível, bicos injetores e catalisadores,  originalmente são desenvolvidos com base na utilização de um determinado tipo de combustível (gasolina + álcool anidro) e a utilização do álcool hidratado (presente no álcool) pode alterar a vida útil de alguns componentes”, explica Antônio Torres, coordenador do Organismo de Inspeção do Senai-SP.

A entidade alerta ainda que todo veículo com alteração de característica deve ser regularizado, e de acordo com a resolução n.º 25/02 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), as alterações devem ser realizadas mediante autorização prévia do Orgão de Trânsito (DETRAN, CIRETRAN). “O automóvel deve passar por uma inspeção veicular para obtenção do Certificado de Segurança Veicular (CSV). Mais informações sobre o certificado podem ser obtidas por meio do Organismo de Inspeção Acreditado pelo INMETRO do SENAI-SP, telefone (11) 6166-1988”, finaliza.

José Fernando Penteado, diretor do Comitê de Veículos de Passeio do Congresso SAE BRASIL 2005 afirma que como qualquer adaptação o desempenho e durabilidade são inferiores ao original. “Em vista dos danos que podem causar nos componentes do veículo, não recomendamos a conversão, além disso, pode ocorrer contaminação do óleo lubrificante e afetar a lubrificação dos mancais, diminuindo a vida útil do motor e aumentando os gastos de manutenção”, completa.

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